histmus blog

13/06/2010

“A música de Beethoven reflete, até o fim, a vontade de viver”

. entrevista publicada em 13.09.2008

. . com Kurt Masur

. . . fonte : Deutsche Welle

 

Um dos pontos altos do Beethovenfest 2008 é a execução do ciclo completo das sinfonias do compositor com a Orquestra Nacional da França sob a batuta de Kurt Masur. Uma entrevista com o maestro alemão de 81 anos.

Bonn: concertos no telão em praça pública

Bonn: concertos no telão em praça pública

Deutsche Welle: Por que o senhor se impõe o desafio de executar todas as nove sinfonias de Ludwig van Beethoven em quatro dias?

Kurt Masur: Sempre que falam de Beethoven, as pessoas acreditam ter formação musical. “Sim, um grande compositor, claro, e…” Ao entrar em detalhes, muitos vêem Beethoven freqüentemente como distração, intérprete das idéias da Revolução Francesa, com bocarra de leão e gestos combativos – e de humor aparentemente limitado. Minha meta é fazê-las entender como ele começou com sua primeira sinfonia. Nos termos de hoje em dia eu diria: tão mal comportado quanto possível.

 

Como concebeu este ciclo? Há algo assim como um arco total?

Claro que é um arco. É mesmo um pouco trabalhoso escutar as sinfonias número um, dois e três em uma noite. Porém, as duas primeiras são um pouco mais curtas e Beethoven só alcançou uma forma sinfônica verdadeiramente pessoal com a terceira.

E é isto o que quero demonstrar através deste exemplo: quem assiste o concerto compreende perfeitamente que a leveza, a poesia, o humor da primeira não têm absolutamente nada a ver com a terceira. E a declaração humanista da terceira, cuja dedicatória original era a Napoleão, como sabemos, e que foi rasgada por Beethoven, irado porque não queria se identificar com um imperador e com alguém que oprimia as pessoas.

Para mim, é decisiva a questão: até aonde vai nossa obrigação, como intérpretes, para com um ouvinte que ao primeiro acorde deseja perceber o espírito dessa música? Devo dizer: a Orquestra Nacional da França me deixa feliz. Nos preparativos, nos ensaios, estivemos à beira da exaustão, pois as sinfonias de Beethoven não são tão fáceis de tocar. Não se pode tocá-las com leveza, mas sim com seriedade. E é preciso levar o humor a sério, e possuir a rapidez com a qual Beethoven súbito muda o temperamento. Estas são coisas que queremos levar até o público. Senão é, enfim, “ah, o velho Beethoven, já conhecemos tudo mesmo”.

 

O senhor descobre ainda hoje em dias coisas novas em Beethoven?

Sempre. Não sabemos mais como os grandes solistas introduziam os temas musicais. E hoje há poucas exceções. Um Yo-Yo Ma, Lisa Leonskaia, Anne Sofie Mutter, eles sentem algo, preparam-se internamente para executar o próximo tema. E é daí que vem o encantamento da platéia.

 

Como explicar hoje Beethoven às pessoas? Isto é sequer possível?

A música de Beethoven é tão rica. Na realidade, não há nenhum sentimento humano que ela não tenha expressado. Seja Die Wut über den verloren Groschen (A raiva pelo tostão perdido) ou Für Elise (Para Elise), ou todas essas pequenas peças que, sabe-se, foram obras de ocasião, para mostrar reverência a uma bela menina ou mulher – apaixonado ele esteve a vida toda, disso sabemos. A tragédia de sua vida foi, quando compunha a Segunda Sinfonia, perceber pela primeira vez que a audição falhava. Foi aí que ele escreveu o Testamento de Heiligensatdt: “Oh, homens, que me considerais incontrolável ou desagradável, só quero dizer que sofro”.

Público vai às ruas em Bonn assistir a concerto sob a batuta de Kurt Masur

Público vai às ruas em Bonn assistir a concerto sob a batuta de Kurt Masur

A outra chave é a Carta à Amada Imortal, despedida de uma das mulheres com que tivera contato nessa época, em Teblitz. Ela não foi enviada, mas existe como documento. Quando executei a Oitava agora em Paris com a minha orquestra, contei aos músicos: “Vejam, Beethoven escreveu as primeiras oito sinfonias no espaço de pouco mais de dez anos. E após a Carta à Amada Imortal ele não escreveu durante dez anos mais nenhuma outra grande obra orquestral. Só então a Missa solene e ainda mais tarde a Nona“.

Precisamos imaginar como se sentia um homem que na época realmente não ouvia nada. Ele regeu a estréia [da Nona Sinfonia], porém atrás dele estava alguém que orquestra e coro pudessem seguir, pois ele mesmo estava totalmente confuso e não tinha o menor controle. Um homem que consegue a façanha de, no fim da vida, mais uma vez escrever uma mensagem para a humanidade. Ele se sentia importante o suficiente para acreditar haver recebido de Deus a missão para tal. Nada de sinfonia da despedida, como a Sexta Sinfonia de Tchaikovsky.

A última mensagem que esse homem doente, solitário e se sentindo miserável legou à humanidade foi: Alegria, bela centelha divina. Isto é grandeza. E dá força também àqueles que apenas escutam a música e que não sabem grandes coisas, pois eles percebem que esta música é plena de superação de dificuldades, melancolia e luto, e que reflete, realmente, sempre e até o fim, a vontade de viver.

Birte Strunz (av)

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12/06/2010

Kurt Masur: mais de 40 anos no primeiro escalão da música

. artigo publicado em 12.09.2008

. . fonte : Deutsche Welle

 

Regente de 81 anos ostenta honra rara para um músico: já por duas vezes foi cogitado para presidente. Decidido, político, brilhante, seu elixir de vida está na música. “Se eu parar amanhã, vocês vão ler meu necrológio”.

Kurt Masur

Kurt Masur

Quem vivencia Kurt Masur regendo um concerto, por exemplo, uma sinfonia de Beethoven, não consegue crer que ele já tenha 81 anos de idade. Concentrado, em constante contato visual com os músicos, seus movimentos comunicam alta tensão, elã e entusiasmo absoluto pela música.

Ao lado do violinista Ruggiero Ricci (e) em 1971, na Komische Oper de Berlim

Ao lado do violinista Ruggiero Ricci (e) em 1971, na Komische Oper de Berlim

Há mais de 40 anos, o maestro alemão está entre os mais importantes chefes de orquestra do mundo. Ele nasceu em 18 de julho de 1927 em Brieg, na Baixa Silésia (hoje Brzeg, Polônia) e estudou piano, composição e regência em Leipzig. Interrompendo os estudos prematuramente, partiu para ganhar experiência em diversos teatros da antiga República Democrática Alemã (RDA).

Masur trabalhou em Halle, Erfurt, Schwerin, assim como na Komische Oper, de Berlim Oriental, nas funções de co-repetidor e regente. Em 1967, assumiu a direção da Filarmônica de Dresden, três anos mais tarde retornou a Leipzig. Como titular da Orquestra Gewandhaus celebrou a partir de 1970 êxitos internacionais, logo se tornando o mais aclamado maestro da Alemanha Oriental.

Cogitado para presidente

Com a 'Nona' de Beethoven Masur encerrou em 1996 26 anos à frente da Gewandhaus

Com a 'Nona' de Beethoven Masur encerrou em 1996 26 anos à frente da Gewandhaus

Até 1997, Kurt Masur deu mais de 900 concertos com a orquestra de Leipzig. O que não o impediu de engajar-se politicamente por seu país. No final de 1989, por ocasião dos “Protestos de Segunda-Feira” contra o regime comunista em Leipzig, e ladeado por outras personalidades locais de destaque, o músico assim se dirigiu ao poder estatal:

“Nossa preocupação e responsabilidade comuns nos trouxeram até aqui, hoje. Somos afetados pelas ocorrências em nossa cidade e procuramos uma solução. Apelamos urgentemente à sua sensatez, para que o diálogo pacífico seja possível.”

Sua corajosa atuação num momento decisivo da história alemã o envolveu numa aura de “salvador de Leipzig”. Numa distinção raramente concedida a um músico, Masur foi cogitado para o cargo de presidente da RDA, de que, contudo, declinou. Em 1993, seu nome foi igualmente cogitado para chefe de Estado da Alemanha unificada.

Concertos para corações solitários

À frente da Orquestra Filarmônica de Nova York, em 2001, em Braunschweig

À frente da Orquestra Filarmônica de Nova York, em 2001, em Braunschweig

Em 1991, ele assumiu a direção da Orquestra Filarmônica de Nova York, que manteve até 2002. Neste período, desenvolveu uma estrutura de programa especial extremamente bem recebida, não apenas pelos nova-iorquinos como em todo o país. Ele descobriu a receita secreta durante um passeio solitário pela Big Apple.

“E aí descobri que, na verdade, Nova York está cheia dessas pessoas solitárias e decidi estruturar meus programas de tal modo que cada um que vá ao concerto tenha algum motivo para dizer: me senti em casa”, revelou o maestro.

O amor no Brasil

São poucos os lugares do mundo aonde Masur não haja levado sua música. Porém, os laços afetivos com o Brasil são especiais: foi lá que conheceu, em 1974, sua terceira esposa, a soprano japonesa Tomoko Sakurai, na época violista da Orquestra Sinfônica Brasileira. O atual diretor artístico da OSB, Roberto Minczuk, foi pupilo de Masur, e o maestro alemão retorna ao país com relativa freqüência.

Neste meio tempo, Kurt Masur transferiu seu local de trabalho do Rio Hudson para o Sena, e dirige a Orquestra Nacional da França. De vez em quando, brinca com a idéia de se recolher à vida privada. Porém, no momento, a sua agenda está bastante cheia, o que Masur não acha nada mau.

“Espero poder ir diminuindo o ritmo gradualmente. Se parar amanhã, muito brevemente vocês estarão lendo o meu necrológio, pois a música faz parte de meu elixir de vida. E não se trata do vício do sucesso.”

(kg/av)

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26/02/2010

Kurt Masur: Sinfonias de Beethoven em mp3

. fonte : Deutsche Welle

O maestro alemão Kurt Masur rege a Orquestra Nacional da França com quatro das sinfonias de Ludwig van Beethoven: a Terceira (Heróica), Quinta (Do Destino), Sétima e Oitava.

Clique nos links abaixo para escutar os arquivos MP3 ou baixá-los para o seu computador.

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